Quando o Atendimento Vira Estratégia: O Brasil no Espelho dos Serviços Compartilhados de 2025
Por Donald Reis
Introdução: de suporte a cérebro da operação
Por muito tempo, Serviços Compartilhados foram encarados como o “back-office com eficiência”. Aquela engrenagem que ninguém vê, mas que faz tudo funcionar. Mas 2025 nos apresenta uma nova narrativa: os centros de serviços agora são ativos estratégicos, capazes de transformar dados em decisões, atendimento em fidelização e custo em investimento com retorno.
E quem diz isso não sou eu — são os números do relatório da SSON Research & Analytics, que analisou as práticas, dores e avanços dos principais Shared Services da América Latina.
A Realidade: uma corrida com diferentes largadas
O estudo deixa claro: a região está em transformação, mas ainda carrega desafios significativos.
• 59% dos líderes classificam seus centros como “médio nível de automação”.
• Apenas 10% indicam uso intensivo de IA.
• 30% apontam a falta de apoio da liderança como a maior barreira à inovação.
• 20% sofrem com processos não padronizados.
• E o Brasil, embora seja o maior mercado da região, ainda atua mais fortemente no atendimento ao mercado doméstico, não sendo a principal escolha como hub regional.
Estamos no jogo. Mas ainda longe do pódio.
O Potencial: onde moram as oportunidades
Por outro lado, o relatório acende luzes em corredores que o Brasil pode — e deve — explorar:
1. Adoção estratégica de IA e automação
o RPA já é realidade, mas a próxima onda é inteligência generativa, aplicada à classificação de tickets, roteamento dinâmico e predição de filas.
o Centros de excelência híbridos estão em alta: times mistos com especialistas de negócio e cientistas de dados trabalhando juntos.
2. Transformação da experiência em métrica
o O NPS e o CSAT ganham espaço sobre os tradicionais SLAs.
o A percepção de valor muda: atender bem é gerar receita, não apenas reduzir custo.
3. Uso de dados como ativo estratégico
o 57% dos entrevistados analisam dados mensalmente com foco em crescimento.
o Mas apenas 11% usam analytics preditivo — a janela para vantagem competitiva ainda está aberta.
Onde está o ROI?
Medir o retorno sobre o investimento (ROI) em serviços compartilhados não é mais um luxo, é uma obrigação.
A fórmula precisa incluir:
• Tempo economizado por automação (ex.: 2.000 horas/mês × R$150/h)
• Redução de filas com IA inteligente
• Diminuição de turnover por aumento de engajamento interno
• Ganhos de satisfação do cliente (CX) como vetor de retenção e receita
Um bom case não é aquele que mostra dashboards, mas aquele que comprova retorno financeiro com base em experiência, eficiência e escalabilidade.
Como começar a usar IA — com os pés no chão e os olhos no horizonte
A introdução de IA não precisa (nem deve) ser disruptiva de uma vez. O caminho sugerido — e validado por líderes globais — é a implantação progressiva e com métricas claras:
1. Automação de tarefas repetitivas
o Elimina trabalho operacional, libera pessoas para decisões.
2. Chatbots com IA generativa
o Reduz filas e permite atendimento simultâneo a milhares de clientes internos/externos.
3. Análise preditiva para gestão de filas
o Antecipar gargalos em vez de apagar incêndios.
4. IA como “conselheira estratégica”
o Modelos que ajudam o gestor a tomar decisões com base em dados reais e simulações de cenários.
A beleza de medir: custo-hora e comparativos entre unidades
Um dos grandes legados da jornada digital é a transparência de dados. E aqui está uma das maiores oportunidades do setor:
• Calcular o custo-hora real de atendimento por unidade de negócio
• Comparar antes e depois de implantações tecnológicas
• Identificar onde o atendimento ainda é gargalo e onde já é diferencial
Esse tipo de dado alimenta dashboards, mas também alimenta decisões de board.
E o que muda na cultura? Tudo
Empresas que transformam seus centros de serviços em plataformas inteligentes vivem uma mudança que vai além da tecnologia: redefinem o papel das pessoas.
• Profissionais são requalificados, não descartados.
• Soft skills como empatia, resolução de problemas e adaptabilidade são valorizadas.
• A centralidade no cliente vira valor — e não apenas discurso.
Conclusão: do backstage para o palco
O estudo da SSON é um retrato honesto de uma região que está se movendo. E se o Brasil quiser ocupar um papel de liderança, precisa acelerar a adoção da IA de forma estruturada, mensurar tudo e contar histórias com dados — não com achismos.
O serviço que antes era invisível, agora pode ser protagonista. Desde que a gente trate cada fila, cada ticket e cada atendimento como parte de uma grande orquestra de valor.